TRANSTORNOS ALIMENTARES E SEUS SINTOMAS
TRANSTORNOS ALIMENTARES E SEUS SINTOMAS
O aumento da prevalência e da incidência de transtornos do comportamento alimentar como anorexia nervosa (AN) e bulimia nervosa (BN) na população ocidental tem sido alvo de muitas controvérsias, pois o aumento da capacidade de detecção e o registro dos casos, nos últimos anos, têm contribuído para elevar os dados estatísticos e, de maneira contraditória, para confundir o entendimento da real evolução desse fenômeno na sociedade1, dois. Existe consenso, no entanto, de que tais problemas atinjam, predominantemente, adolescentes e mulheres adultas jovens1, 3,4, com proporção media na relação entre homens e mulheres de 01h10min, podendo variar entre 1:6 e 1:20, conforme o critério diagnostica utilizado e a modalidade de TCA avaliada6, 7.
Estima-se que o risco de desenvolver TCA pode estar presente em 20% das mulheres jovens, por apresentarem comportamentos subclinicos precursores8-10, embora nem todas cheguem a desenvolvê-los. Walsh, Wheat e Freund4 consideram diabéticas e mulheres atletas como dois grupos de alto risco para o desenvolvimento de TCA e, entre universitárias, Fiates e Salles11 encontraram comportamento de risco em mais de 20% da população pesquisada. De forma geral, a prevalência de AN varia entre 0,5% e 3,7% e de BN de 1,1% a 4,2%7, apresentando elevado percentual não só nos países desenvolvidos, onde subsistem as características econômicas e socioculturais para o seu desencadeamento, como também nos países em desenvolvimento12. Em meninas adolescentes, os números podem ser substancialmente maiores. Segundo Fairburn e Harrison1, nesse grupo a prevalência de AN pode variar de 0% a 7%.
A prevalência dos TCA e ainda mais elevada em pessoas que exercem determinadas atividades (modelos, bailarinas, atletas e profissionais da área da saúde), provavelmente mais vulneráveis aos TCA pelo fato de sofrerem, mais intensamente, pressões associadas a padrões estéticos, as quais se respondem por meio da exibição de um corpo magro4,7,11. Estudos, como o de Fiates e Salles11, sugerem que indivíduos que apresentam preocupação com seu peso e imagem corporal costumam fazer a opção por área de estudo correlata, em função, justamente, desse interesse pessoal anteriormente manifesto. Em atletas, a prevalência de TCA ainda não e suficientemente conhecida, mas alguns estudos disponíveis demonstraram a frequência aumentada em certas modalidades desportivas3, em virtude, sobretudo, dainfluencia do baixo peso corporal na determinação de uma melhor performance e da ênfase no controle de peso a que são submetidas, como salto de esqui, ciclismo de estrada, alpinismo, ginástica artística ou rítmica e corridas de longa distancia13. O aumento da participação feminina na pratica de diversas modalidades permite estimar a extensão desse problema, pois, nos últimos 20 anos, essa participação cresceu 600%, superando a marca de 1,9 milhão de atletas14. Nesse grupo, e comum a ocorrência de uma síndrome que agrega três componentes inter-relacionados: transtorno alimentar, amenorreia e osteoporose. E a chamada tríade da mulher atleta (TMA), que não e exclusividade de atletas de elite15. Diante do exposto, o objetivo deste estudo e investigar a prevalência de comportamentos alimentares anormais e a satisfação com a imagem corporal entre universitárias de um curso de educação física situado em uma universidade do município do Rio de Janeiro (região Sudeste do Brasil).
William Gull e Charles Lasègue ainda no século XIX (1873 e 1874, respectivamente) descreveram casos de mulheres que se recusavam a comer, tinham baixo peso e amenorreia. Além disto, apresentavam uma dedicação extrema à prática de atividade física, apesar de seu estado de caquexia. Estas descrições se assemelham ao que conhecemos hoje por anorexia e bulimia nervosa, descritas como transtornos alimentares pelas classificações da CID-10 (OMS, 1992) e DSM-IV (APA, 1994). A anorexia nervosa é representada por uma distorção na maneira como o indivíduo avalia a forma, peso e tamanho de seu corpo (imagem corporal). Somado à distorção de imagem corporal, há um medo mórbido de engordar e recusa alimentar. Para perder peso, o indivíduo submete-se a longos períodos de jejum ou restrição alimentar. Uso de inibidores de apetite, laxantes e diuréticos e atividade física também pode ocorrer. Há uma perda de peso importante, geralmente maior que 15% do peso ideal. Outro sinal importante no sexo feminino é a presença de amenorreia ou diminuição da libido no sexo masculino. A prevalência da anorexia nervosa é de 1% na população geral com 90% dos casos em mulheres. A bulimia nervosa apresenta vários aspectos semelhantes aos da anorexia nervosa, como distorção de imagem corporal e um medo mórbido de engordar. Os métodos mais comuns utilizados para perda/controle de peso são indução de vômitos, uso de laxantes, diuréticos e inibidores de apetite, geralmente após um episódio exagerado de alimentação. Os pacientes com bulimia nervosa apresentam peso normal ou discretamente acima do normal. A prevalência na população geral pode chegar a 4%. A atividade física pode ser um dos métodos utilizados pelos indivíduos com transtorno alimentar para perda/controle de peso, ocupando lugar dominante como estratégia para perda de peso (Beumont et al., 1984).
Vários estudos demonstra que a prática regular de exercício físico está relacionada a benefícios para a saúde. Por outro lado, a inatividade física e um estilo de vida sedentário estão relacionados a fatores de risco para o desenvolvimento ou agravamento de certas condições médicas, tais como doença coronariana ou outras alterações cardiovasculares e metabólicas (Maron, 2000). Gullete e Blumenthal (1996) descreveram os benefícios da atividade física como tratamento adjunto nos quadros depressivos e ansiosos, sugerindo que esta deva ser prescrita em associação às demais terapias nestes quadros. Considerações sobre algumas hipóteses dos mecanismos fisiológicos envolvidos na melhora do humor e sintomas ansiosos após a prática de exercício aparecem em uma revisão de Morgan (1985). A primeira hipótese destacada é descrita como “hipótese da distração”, onde melhoras nos níveis de ansiedade/depressão seriam obtidas pelo fato do indivíduo distanciar-se de estímulos estressantes vitais durante a atividade física, não pela atividade física per se. Uma segunda hipótese descrita é a das monoaminas, onde a prática continuada de exercício contribuiria para aumentar os níveis centrais de serotonina e noradrenalina, neurotransmissores reconhecidamente envolvidos nos transtornos afetivos e ansiosos. Por fim, a terceira hipótese e também a mais conhecida, envolve um aumento nos níveis de endorfina, um opióide endógeno implicado nos efeitos de bem-estar físico e psíquico descritos após prática de atividade física. Em oposição aos aspectos positivos relacionados à prática racional e regular de exercício físico, uma série de estudos avaliou que muitos indivíduos podem praticar exercício de uma forma inadequada e excessiva, que passará então a causar prejuízos para a saúde do mesmo. Nestes estudos parece não haver um consenso entre os autores na denominação e classificação do fenômeno. Denominações como “adição à corrida” (Glasser, 1976), “correr obrigatório” (Yates, 1983), “exercício mórbido” (Chalmers, 1984), “exercício compulsivo” (Passman e Thompson, 1988; Yates, 1991a) e “dependência de exercício” (Veale, 1987) são alguns dos termos usados para descrever o problema. A imprecisão conceitual prejudica sobremaneira o estudo do quadro, não sendo possível definir se a profusão de termos é mera tautologia ou se se tratam, de fato, de síndromes distintas. Apesar destas outras terminologias serem empregadas, o termo exercício físico excessivo (EFEx) será utilizado neste artigo por não estar relacionado a nenhum quadro psiquiátrico específico. O exercício físico excessivo é descrito por alguns autores como apenas um sintoma de um TA (Veale, 1987) enquanto outros sugerem ser o problema uma variante de um transtorno alimentar, mais frequente no sexo masculino, constituindo desta forma uma síndrome (Yates et al, 1983). Veale (1987) propôs que o exercício físico excessivo deveria ser visto como um quadro de dependência, diferenciando-o entre primário e secundário. O quadro primário estaria associado a atletas e será descrito posteriormente. A dependência secundária estaria presente em indivíduos com transtornos alimentares, tendo como único objetivo a perda/controle de peso. Preocupação mórbida com o peso e distorção da imagem corporal estariam presentes, uma vez que o quadro seria secundário a um transtorno alimentar. Brewerton et al (1995), investigando a atividade física em 100 mulheres com transtorno alimentar, observaram que 28% delas apresentavam exercício excessivo. Quando comparadas com aquelas sem exercício físico excessivo, apresentavam maior insatisfação com o corpo e uso de diuréticos e laxante mais frequente. Comparando um grupo de pacientes internadas de transtorno alimentar com um grupo controle, Davis et al (1994) verificaram que 78% daqueles com TA praticavam exercício excessivamente e que 60% eram atletas de competição antes do início de seu quadro alimentar. Concluem que a hiperatividade nestes indivíduos não deve ser vista apenas como um traço secundário em um TA e que para um grande número de pacientes com anorexia nervosa, o exercícios está envolvido na patogênese e progressão da doença. Estudo realizado em mulheres com bulimia e anorexia nervosa, avaliando a atividade física do indivíduos, mostrou que a maioria praticava atividade física excessiva na fase aguda do TA e que sua prevalência era maior entre aquelas com anorexia nervosa. O estudo sugere que o padrão de exercício pré-mórbido seja um fator preditivo de comorbidade entre transtorno alimentar e atividade física excessiva (Davis et al, 1997).
Atletas e transtornos alimentares Yates et al (1983) descrevam indivíduos que não conseguiam parar ou diminuir o tempo e intensidade de treinos de corrida apesar de contraindicações para tal, como fraturas de estresse ou problemas familiares, e os chamaram de “corredores obrigatórios”. Analisando 60 maratonistas do sexo masculino, puderam observar características em comum entre eles e indivíduos com TA, como auto-expectativa elevada, inibição da raiva e tolerância elevada ao desconforto físico. Notaram também que à despeito do aumento da força física, continuavam preocupados com seu desempenho atlético. Preocupação constante com dieta e necessidade de redução de peso estavam presentes e relacionados também com o desempenho atlético (Yates et al, 1983). Em estudo posterior (Yates et al, 1991a), comparando corredores obrigatórios com corredores não-obrigatórios, observaram que apesar de ambos os grupos obterem pontuação normal no MMPI (Minnesota Multiphasic Personality Inventory, para análise de personalidade), os primeiros tinham maior pontuação em várias subescalas. Os corredores obrigatórios também mostravam-se mais preocupados e rígidos com o controle de seu peso. Blumenthal et al (1984) compararam 43 corredores obrigatórios com 24 indivíduos anorexia nervosa. Submetendo-os ao MMPI observaram que apenas os segundos apresentavam pontuação elevada para depressão, ansiedade e hostilidade. Ao contrário de Yates, não observaram alterações psicopatológicas no grupo de atletas, isentando-os de semelhanças com aqueles com TA. Segundo a definição de Veale para dependência de exercício, citada anteriormente, na dependência primária a perda de peso não seria o objetivo único, acometeria principalmente atletas e a perda de peso não seria excessiva para não comprometer o desempenho atlético. Na dependência primária, apesar de aparecerem sintomas semelhantes aos da anorexia nervosa, como amenorréia e rigor na dieta, não existe uma preocupação mórbida com o peso e não há, a princípio, distorção de imagem corporal. No entanto, muitos atletas podem TAs, sendo grupo de risco para o desenvolvimento de tais patologias. Logo, deve-se estar atento para esta possibilidade quando da avaliação clínico-psiquiátrica desses indivíduos. Bailarinos e modelos, devido a pressões profissionais, podem também serem vítimas de transtornos alimentares. Garner e Garfinkel ( 1980), estudando dançarinas profissionais e modelos, observou maior prevalência de TAs (6,5% de anorexia nervosa no grupo de dançarinas) e preocupação excessiva com o peso naquelas sem TAs. Sugerem que a pressão para se tornar magro é fator envolvido na gênese do TA nestes casos.
autor desconhecido
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